
Pois bem. Estou aqui sem sono. Sentado na poltrona com uma leve brisa fria entrando pela janela. Há um evidente silêncio. São 4:41 da manhã. Ouço o balançar da palmeira real que após 15 anos alcançou o 4º andar do prédio onde moro. Bem ao fundo da mencionada quietude tem uma turma de moradores de rua conversando. Não sei exatamente o teor do papo, mas o dia já começou para eles. Um ônibus acaba de parar e passar. O freio a ar deflagra o tamanho do veículo. Provavelmente com um pequeno punhado de pessoas. Trabalhadores que estão terminando seu turno e voltando para casa. No momento não existe qualquer possibilidade de dormir. Agora foi um carro que passou. A velocidade é maior. Ouve-se apenas o contado do pneu com o asfalto. Mas essas noites tem sido frequentes ultimamente. Aliás, não consigo me lembrar de ter visto o amanhecer. Apenas sinto que existe o dia. Entretanto, não tenho o visto ultimamente. Acho que esse "ultimamente" faz parte de um período maior do que uma simples noite. Estranho. Estaria eu como, já dizia um professor de literatura que tive, um nefelibata? Lembro com carinho das aulas desse mestre. Aulas de arcadismo, romantismo, modernismo, o bucolismo e eu ali, prestando atenção na janela e no mundo lá fora. Pobre Noah. Nessa época não percebia que para ganhar o mundo era preciso primeiro prestar atenção no nobre professor. Tanto tempo jogado fora. Tanto conhecimento logo ali. Seria tão fácil mudar meu futuro. Certamente não estaria sentando aqui nessa poltrona. Certamente não teria os únicos três sentidos que preencheram todos os vazios da minha vida: minha esposa (Grace) e minhas crianças (Chloe e Ethan). Então, prefiro estar onde estou. Aqui na poltrona. É extremamente triste imaginar um futuro alternativo - agora no presente - sem minha família. Notadamente, faria tudo de novo. Um bocejo. É, o sono está chegando. Vou dormir. Quando acordar amanhã ou daqui a pouco estarei novamente aqui na poltrona. Nossa, acabo de sentir o cheiro do cabelo do Ethan, um shampoo tão cheiroso, mas não tenho lembrança da última vez que o vi. Ele está logo ali no seu quarto. Quanta saudade. Já esqueci como chegar ao quarto. É tão próximo da poltrona. Basta caminhar na cerâmica fria, acender a luz do corretor, entrar à direita e dar um beijo em Ethan e Chloe. Não sei porque sinto que tenho que deixar isso para daqui a pouco ou depois. Lá vem o sono. Basta pensar em levantar. Agora estou com um leve frio nos pés. Cubro com o lençol. Mais carros passam na rua. O vizinho espirra. A vizinha abre a porta. Deve ir à padaria. O mundo está começando. Eu, por outro lado, preciso descansar para voltar. Não sei bem ao certo para onde. Mas sinto que preciso voltar, pelos meus amores. Por Grace, Chloe e Ethan.
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